Crédito: Raphael Zarko (Extra.Globo) |
Sócrates caminhava com a mulher Kátia pelas ruas de Havana, apenas sete dias antes da primeira da três internações por que passou este ano, antes de vir a morrer, no último dia 4. Foi quando viu alguns meninos, sem camisa e descalços, jogando bola em frente a uma das muitas praças com as imagens de Fidel Castro e Che Guevara, e pediu para a mulher registrar o momento. Cena incomum na capital cubana, o futebol puro das crianças o fez refletir sobre o convite recente que recebu para trabalhar na seleção do país comunista.— Ele me disse que esta imagem dos garotos jogando futebol na rua representa o verdadeiro futebol arte. Sócrates lembrou que foi assim que o Brasil passou a existir para a bola — lembra Kátia Bagnarelli, de 30 anos, viúva do "Doutor", que o acompanhou, junto a casal de amigos, na viagem.
A proposta para Sócrates trabalhar na seleção cubana foi feita com cautela por uma pessoa ligada a Associação de Futebol de Cuba. O ex-jogador da seleção das Copas de 1982 e 1986 sempre foi admirador do regime cubano e, principalmente, do povo. Um de seus filhos se chama Fidel.
— Teve uma pessoa do consulado cubano que veio conversar sobre essa possibilidade dele assumir a seleção. Eles sabiam que para chamá-lo para trabalhar, as pessoas nunca iam direto ao assunto. Ele não queria sair do Brasil, mas era um namoro que existia há um tempo — conta ela, que viveu três anos ao lado de Sócrates.
Segundo os amigos e o próprio Sócrates, em entrevista sobre o assunto na Folha de S. Paulo, o ex-jogador queria receber como qualquer cidadão cubano.
— Ele dizia: "Se um dia for técnico ou ajudar de alguma forma a seleção cubana, não quero receber qualquer valor exorbitante". Tinha que ser igual a um cubano — lembra o amigo de longa data Mazinho.
O produtor Fernando Kaxassa conta que Sócrates tinha espírito cubano.
— Ele tinha uma relação muito forte com o povo cubano. Adorava ir para Havana, era recebido com muito carinho por todos, mesmo quem não sabia que ele tinha sido jogador — diz Fernando, que estava em produção de um filme sobre a história do amigo quando ele morreu.
'Um banho de cidadania' nas visitas a Cuba
Líder da democracia corintiana nos anos 1980, Sócrates sempre defendeu o regime político de Fidel Castro. O Doutor se mostrava impressionado com a forma com que os cubanos viviam, sob as regras rígidas de Fidel e Raul — ele admirava ambos — e oprimido pelo poder econômico dos EUA.
— Um banho de cidadania, era assim que Sócrates dizia se sentir em Cuba — lembra Kátia, que vai levar adiante projetos culturais que ele queria desenvolver no Brasil e, segundo ela, nunca teve qualquer apoio.
Durante a última estadia em Cuba, Sócrates também se encontrou com um embaixador da Venezuela. O encontro era para marcar uma reunião com o presidente Hugo Chávez. Após a morte do Doutor, o governo venezuelano disse, em nota, que Sócrates "manteve vivo o sonho de Bolívar", em referência ao revolucionário venezuelano.
— Existia a expectativa de levar essas ideias para a Venezuela. Aqui, no Brasil, por questões políticas, ele nunca conseguiu levar adiante nada disso — afirma ela, que planeja uma homenagem.
— Não vai ser nada de jogo. Ele dizia: 'já joguei muito, chega' — conta Kátia.
No amistoso dos 100 anos, tudo igual
No amistoso do centenário ontem, no estádio Pedro Marrero, em Havana, a frustração do empate nos acréscimos. Cuba e Costa Rica empataram por 1 a 1 na comemoração dos 100 anos.
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