Ivan Pinheiro*
A bomba que explodiu em Bogotá, logo após a posse do novo presidente colombiano, obviamente não foi de autoria das FARC, como insinuou a mídia burguesa internacional. Em toda a sua história, as FARC jamais recorreram ao terrorismo; nunca explodiram uma bomba que pudesse atingir inocentes.
O mais corriqueiro expediente da CIA, no mundo todo, é exatamente promover atentados e explosão de bombas, com vítimas, sob falsa bandeira, ou seja, acusando de autoria alguma organização contrária aos interesses imperialistas. Para a guerrilha colombiana, seria um tiro no pé, no momento em que desenvolve uma campanha por um diálogo de paz mediado pela Unasul.
A bomba foi obra dos órgãos de informação e repressão da Colômbia, assessorados pela CIA e pelo Mossad.
A bomba foi obra dos órgãos de informação e repressão da Colômbia, assessorados pela CIA e pelo Mossad.
A bomba foi contra as FARC, para isolá-las de governos e setores progressistas e reformistas e tentar sepultar qualquer possibilidade de negociações de paz entre o estado Colombiano e a insurgência. A bomba foi para classificar a guerrilha como “terrorista”, de forma a não ser reconhecida como parte legítima de uma negociação de paz, que não interessa ao imperialismo nem à burguesia colombiana. Ao primeiro, para ampliar sua presença militar na Colômbia e fazer dela o que Israel representa para o Oriente Médio. À segunda, para continuar se locupletando da ajuda financeira dos EUA e atribuindo às FARC o narcotráfico que, em verdade, é comandado pela máfia dirigida por Uribe e Santos, que controla a produção e a distribuição da cocaína, inclusive para os EUA.
Os verdadeiros terroristas escolheram o melhor momento para explodir a bomba: o inicio do novo governo colombiano e as vésperas de eleições importantes no Brasil. Os reformistas, em seus cálculos eleitorais, precisam se mostrar contrários às FARC para ganhar votos, já que a insurgência está satanizada pela mídia.
Foi exatamente para se aproveitar da reta final da eleição brasileira que Santos, o novo Presidente da Colômbia, veio recentemente ao nosso país. Cinicamente, ao mesmo tempo em que pede ao Brasil para não se intrometer no conflito interno colombiano, escolheu candidatos a Presidente para audiências públicas, com o objetivo de comprometê-los com a classificação das FARC como organização “narcoterrorista”.
Que José Serra (PSDB) se comprometesse publicamente nesse sentido não foi nenhuma surpresa. Em sua campanha tem feito críticas, pela direita, em relação à pragmática política externa do governo Lula, que é progressista nas relações entre Estados e governos e imperialista nas relações comerciais.
A surpresa foi Dilma Roussef (PT) ter aderido à demonização da insurgência, logo ela que a esquerda reformista classifica como socialista, com o único argumento de que participou, como guerrilheira, da luta armada contra a ditadura em nosso país! Santos conseguiu uma grande vitória, arrancando compromissos públicos dos candidatos que a mídia transformou em favoritos.
O Brasil não foi escolhido aleatoriamente para ser o primeiro país visitado pelo novo Presidente colombiano. Ele precisa evitar que nosso país lidere, nos marcos da UNASUL, uma grande mobilização a favor de um processo de negociações para uma paz democrática na Colômbia, que tem como pré-requisito a classificação da guerrilha como organização política beligerante e não como “terrorista” ou “narcotraficante”.
Este é mais um indício de que um previsível governo Dilma/Michel Temer poderá se colocar à direita do governo Lula. Este, pelo menos, ficou “em cima do muro” sobre o tema. Com o objetivo principal de incrementar negócios de empresas brasileiras na Colômbia, Lula conciliou com a instalação de mais sete bases militares norte-americanas na Colômbia e celebrou inúmeros acordos militares e comerciais com esse país (inclusive mais onze na semana passada), mas jamais classificou as FARC como “terrorista” ou “narcotraficante”. Aliás, o compromisso que Dilma assumiu com Santos desmentiu o próprio assessor internacional de Lula (Marco Aurélio Garcia) que, na véspera, dissera que o “governo brasileiro não é uma agência de classificação e, por isso, não classifica a guerrilha como organização terrorista”.
Este compromisso público de Dilma cria condições para que o Poder Executivo ou o Congresso Nacional, num governo em que o PMDB terá mais peso - com um Vice-Presidente forte, mais governadores (apoiados pelo PT), mais ministros, as maiores bancadas e Presidências na Câmara e no Senado - transforme em lei a classificação das FARC como “narcoterrorista”, como em alguns países da Europa, de forma a tornar crime qualquer solidariedade ou relacionamento com a insurgência.
Agora fica compreensível a recente entrevista do secretário de relações internacionais do PT, no jornal Brasil de Fato. Ele afirma que as FARC devem “declarar um cessar-fogo unilateral” como requisito para negociações e propõe que “o conflito na Colômbia deixe de ser militar e passe a ser político eleitoral”, como se eleição fosse o único espaço para a esquerda fazer política. Este é exatamente o discurso de Santos para “resolver” o conflito, com a rendição da guerrilha.
Para reforçar sua argumentação, o dirigente petista, tido como à esquerda em seu partido, lembra que, em El Salvador, o atual presidente foi eleito pela legenda de uma antiga organização guerrilheira, a FMLN. É verdade. Faltou dizer que o mesmo acontece na Nicarágua, cujo governo atual é da FSLN.
Não é preciso apelar às FARC para aceitar uma negociação, como se a organização fosse contra. Basta ler os comunicados das FARC e assistir à mensagem de seu comandante, Alfonso Cano, propondo negociações, com a mediação da UNASUL. Se for por falta de fonte, pode-se recorrer à pagina do PCB (WWW.pcb.org.br). Se queremos a solução do conflito, temos que apelar aos que não querem a negociação, não aos que a querem!
Nos anos 80 e 90, houve na América Latina um processo negociado de desmilitarização de grupos guerrilheiros. Todos esses entendimentos resultaram na transformação das guerrilhas em organizações políticas legais. Na Colômbia, entretanto, este processo terminou com o cruel assassinato de mais de 5.000 membros da União Patriótica, partido político então legal, que incorporava parte dos militantes das FARC que desceram das montanhas, do Partido Comunista Colombiano e de outras organizações de esquerda. Entre os assassinados a sangue frio pelas milícias de direita, estavam o candidato à Presidência da República e os parlamentares eleitos pela UP, intelectuais, sindicalistas e lideranças de massa.
O estado terrorista colombiano não cumpriu o acordo, assinado na presença da imprensa mundial e de personalidades internacionais.
Portanto, as FARC não podem promover uma rendição unilateral, incondicional, uma paz de cemitérios, jogando fora um patrimônio de décadas de luta e submetendo seus militantes a um genocídio. O que pretendem é um diálogo que torne possível uma paz democrática, que ponha fim não só ao conflito, mas ao terrorismo de Estado, à expulsão de camponeses de suas terras, às milícias paramilitares, ao assassinato e à prisão de milhares de militantes e que assegure liberdades democráticas e mudanças econômicas e sociais.
Como uma força beligerante que está nas montanhas pode promover um “cessar-fogo” unilateral, deixando-se matar pelas forças de repressão?
Imaginem se Ho-Chi-Min fosse para as negociações de Paris com suas tropas tendo cessado fogo? Qual o resultado da guerra do Vietnã?
Não dá para tergiversar. Esta é uma proposta ditada pelo oportunismo “político eleitoral” e para favorecer a política externa brasileira, que tem como fundamento fazer do Brasil uma grande potência capitalista mundial. E, principalmente, para desarmar qualquer resistência dos povos à opressão e limitar a luta ao seu aspecto “político-eleitoral”.
Ao invés de pedirmos o suicídio coletivo de revolucionários “não eleitorais”, temos que iniciar imediatamente uma campanha para obrigar o estado colombiano a negociar. E o Brasil tem todas as condições para liderar e fazer acontecer esse movimento.
Desmontar o “Cavalo de Tróia” montado pelo imperialismo na Colômbia não importa apenas para evitar uma guerra com a Venezuela ou a derrubada de seu governo. Como disse Fidel Castro, as bases militares ianques na Colômbia são punhais no coração de toda a América Latina, inclusive, não nos iludamos, sobre o Brasil, cujas extraordinárias riquezas naturais – a biodiversidade da Amazônia, as imensas reservas de água doce e o pré-sal - são os principais objetos da cobiça dos Estados Unidos em nosso continente.
Daí a importância de mobilizarmos personalidades e forças progressistas em nosso país para nos somarmos à iniciativa adotada pela Senadora colombiana Piedad Córdoba e diversos intelectuais do nosso continente que criaram recentemente, em Buenos Aires, o movimento “Latino-Americanos pela Paz na Colômbia”.
* Ivan Pinheiro é Secretário Geral do PCB
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