"Se você treme de indignação perante uma injustiça no mundo, então somos companheiros." (Che Guevara)

terça-feira, 23 de novembro de 2010

O enigma do lucro

Autor: Paiva Neves (*)


O trabalhador, ao contrário do patrão, por mais que trabalhe, não consegue acumular bens, além do estritamente necessário para a sobrevivência de si e de sua família. O capitalista, ao contrário, através dos balancetes mensais de suas empresas constata o aumento de suas riquezas. A máquina ideológica do capital passa para os trabalhadores a idéia de que na sociedade capitalista todos são iguais em termos de oportunidades. O patrão é rico e o trabalhador é pobre, unicamente, porque um é ou foi mais esperto do que o outro. O patrão soube aproveitar todas as oportunidades que a vida lhe ofereceu, teve garra, foi audaz, enquanto que o trabalhador, descansado e sem iniciativa, não teve a audácia necessária para vencer na vida. Será isso verdade? De onde vem a riqueza do patrão, como é que ela se multiplica e por que o trabalhador, literalmente, se mata de trabalhar e está sempre com a corda no pescoço? Qual o mistério por trás do acúmulo de riquezas do patrão e a situação de miséria da classe trabalhadora?

Os patrões têm o domínio não só das fábricas, dos bancos e das terras. Os patrões, enquanto classe, dominam também os rádios, os jornais, a televisão, a internet, as escolas e o Estado com suas instituições. Através de toda essa superestrutura, a classe patronal termina dominando ideologicamente toda a sociedade. Dessa forma, a religião e a própria família terminam sendo correia de transmissão da propaganda da dominação dos patrões sobre os trabalhadores.

Quando toda essa máquina de difusão da ideologia capitalista diz que um é rico porque é esperto e o outro é pobre porque é preguiçoso, está ocultando a verdade. Esconde porque, no dia que a classe trabalhadora descobrir o mistério de como acontece a acumulação da riqueza, adquirirá consciência de classe, tomará o poder e transformará a sociedade.

Inicialmente, é necessário compreendermos que unicamente o trabalho é capaz de gerar riqueza. Uma máquina é só uma máquina. Por si só ela não acrescenta nenhum valor à mercadoria. A única coisa capaz de acrescentar valor no processo de produção é o uso da força de trabalho. Não confundir trabalho com força de trabalho. Força de trabalho é a energia física e intelectual que o trabalhador gasta durante o processo de produção. O trabalho é o resultado da ação dos trabalhadores sobre a matéria prima e os instrumentos de trabalho. Quando o patrão contrata o trabalhador para que este passe determinado tempo na sua fábrica trabalhando, não está comprando o seu trabalho. Está comprando sua força de trabalho.

Vamos imaginar que um determinado patrão tem uma determinada soma de dinheiro. Geralmente ele pega esse dinheiro do próprio Estado, através de empréstimos e incentivos, e quer montar uma fábrica para produzir sapatos. Digamos que ele tem 10 milhões. Digamos ainda, que do total desta soma, quatro milhões ele use para construir a estrutura física da fábrica. Com três milhões ele compre os outros instrumentos de trabalho, como máquinas e equipamentos. Do restante ele compre dois milhões de matéria prima e com o um milhão que sobrou contrate a força de trabalho.

A fábrica começa a produzir e ao final do ciclo do processo de produção, o patrão que tinha determinada quantia de dinheiro, agora tem essa quantia acrescida de outro valor. Esse valor a mais o patrão chama de lucro. Mais de onde vem o lucro? O trabalhador decifrando esse enigma, com certeza desvendará o mistério da exploração do capital sobre o trabalho. De uma classe sobre outra. Todo o dinheiro que o patrão tinha e que investiu na construção da fábrica, na compra de maquinário, matéria prima e na contratação de trabalhadores transformou-se em capital. Esse capital é de dois tipos. Um é o capital constante que são as máquinas, prédio, matéria prima e outros instrumentos de trabalho e o outro é o capital variável que é a força de trabalho que foi contratada.

A parte constante do capital não gera novo valor, apenas transfere o valor existente para as mercadorias produzidas. O valor da matéria prima é transferido integralmente e de uma só vez para as mercadorias enquanto que o valor de prédios, máquinas e equipamentos é transferido lenta e gradualmente, durante toda sua vida util. Quando uma máquina envelhece e não mais funciona é porque já transferiu todo o seu valor para as mercadorias ao longo do tempo.

Portanto, máquinas, matéria prima, prédio e demais instrumentos de trabalho não criam valor, apenas transferem seus valores para as mercadorias que foram produzidas. Daí ser chamado de capital constante. Já o capital que é empregado na aquisição de força de trabalho, esse sim, gera um valor novo. O capitalista contratou um número determinado de trabalhadores e paga a cada um deles uma diária de vinte reais, por uma jornada de oito horas de trabalho. Suponhamos que ao término da terceira hora de trabalho eles já tenham produzido o suficiente para pagar seus salários de todo o dia. Pela lógica, eles parariam de trabalhar aí, porem o patrão dirá: - calma lá! Eu os contratei para trabalhar oito horas e não três. Os operários dirão: - realmente foi, e continuaram trabalhando. Essas horas excedentes serão apropriadas pelo patrão. São horas não pagas. Este trabalho excedente é apropriado pelo capitalista. Eis aí o enigma do lucro patrão.

* Paiva Neves é do PCB Ceará e membro do CC.

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